A inteligência artificial e o dilema da educação moderna

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A entrevista abaixo foi concedida ao Projeto Puxa a Cadeira, da Faculdade de Letras da Universidade Federal de São João Del Rey, em junho de 2024. Os temas variaram entre inteligência artificial na educação e o lançamento de um livro sobre IAs para professores. 

  1. Você pode nos contar um pouco sobre sua trajetória na educação e como o interesse pela inteligência artificial surgiu?

Sou professor da rede pública de Contagem desde 2006. Sou também pai da Malu e um apaixonado pelo Cruzeiro. Meu interesse por inteligência artificial começou há alguns anos, quando comecei a ler, pesquisar e participar de eventos sobre o tema. Ao me aprofundar, percebi lacunas em como a IA pode contribuir na prática diária dos professores.

  1. O que motivou a criação do livro “100 Atividades ou Mais com Chat GPT para Professores”?

Junto com a professora Patrícia Goulart, também da rede pública de Contagem e que fez o mesmo mestrado que eu, decidimos escrever este livro para oferecer uma abordagem pedagógica sobre a inteligência artificial. O objetivo é apresentar ferramentas e práticas que ajudem os professores a integrar a IA em suas aulas, abordando tanto a criação de conteúdos quanto a ética no uso dessas tecnologias.

  1. Você pode explicar a diferença entre inteligência artificial preditiva e generativa?

Sim, a inteligência artificial preditiva baseia-se em bancos de dados e comportamentos anteriores para gerar respostas. Um exemplo é o algoritmo do Netflix, que sugere filmes baseados no que o usuário já assistiu. Por outro lado, a IA generativa, como o Chat GPT, cria novos conteúdos a partir de comandos dados pelo usuário. A generativa se destaca por permitir interações mais complexas e personalizadas.

  1. Como o Chat GPT transforma a interação entre professores e tecnologia?

O Chat GPT permite que os usuários se comuniquem com a IA de forma semelhante a uma conversa. A IA é alimentada por um vasto banco de dados, o que possibilita uma geração de conteúdo baseada nos prompts dados pelo usuário. Essa abordagem facilita o uso da IA no contexto educacional, já que professores podem gerar atividades e recursos de forma rápida e acessível.

  1. Quais os desafios enfrentados pelos professores ao incorporar a IA em suas práticas?

Um dos principais desafios é a resistência à mudança. Muitos educadores ainda se sentem inseguros sobre como usar a tecnologia e temem que a IA possa substituir suas funções. No entanto, é crucial que eles reconheçam que a IA pode ser uma aliada na melhoria da prática pedagógica. É fundamental promover a formação contínua para que os professores aprendam a utilizar essas ferramentas a seu favor.

  1. Você mencionou a questão da ética no uso da inteligência artificial. Pode elaborar mais sobre isso?

A ética no uso da IA na educação é um aspecto crítico, pois envolve garantir que as tecnologias sejam utilizadas de forma responsável e justa. Isso inclui a reflexão sobre como as informações geradas podem impactar o ensino e a aprendizagem, e se estão alinhadas com os valores educacionais. Além disso, é importante que os professores avaliem se as práticas de IA respeitam a diversidade dos alunos e promovem a inclusão.

  1. Como a pandemia influenciou a adoção de tecnologias educacionais, incluindo a IA?

A pandemia acelerou a transformação digital na educação, forçando escolas e professores a se adaptarem rapidamente ao ensino remoto. Isso destacou a necessidade de integrar tecnologias de forma eficaz nas práticas pedagógicas. Muitos educadores se deram conta da importância da tecnologia e começaram a buscar maneiras de usar a IA para melhorar suas aulas e facilitar o aprendizado dos alunos.

  1. Qual a sua perspectiva sobre o futuro da inteligência artificial na educação?

Acredito que a IA será cada vez mais integrada ao ensino, oferecendo ferramentas que vão além da automação de tarefas. O futuro envolve uma colaboração mais profunda entre educadores e tecnologias, onde a IA pode ajudar a personalizar o aprendizado e atender às necessidades individuais dos alunos. É um caminho que requer preparação e abertura para mudanças, mas que pode trazer benefícios significativos para a educação.

E sobre a curadoria do que a IA produz, como você vê essa questão?

A curadoria é essencial. A IA pode gerar muitas informações, mas sem uma análise criteriosa, corremos o risco de contaminar o conhecimento com dados imprecisos. Por exemplo, o chat GPT, uma ferramenta de IA generativa, já apresentou “alucinações” ao fornecer informações erradas. Isso mostra que precisamos sempre filtrar e validar o que a IA produz.

Como as escolas e universidades estão lidando com esses dilemas?

Recentemente, houve um caso de um professor que foi processado por alegar que os textos de seus alunos foram gerados por IA. Os alunos entraram na justiça, e o professor teve que provar sua afirmação. Isso nos leva a refletir sobre a ética no uso da inteligência artificial. Por exemplo, é possível usar IA para criar imagens de pessoas em situações vexatórias. Precisamos discutir esses limites éticos e como eles se aplicam à educação.

Você acredita que os professores estão preparados para essa nova realidade?

É fundamental que os professores compreendam as ferramentas que os alunos estão utilizando. Se um educador não entender como o chat GPT ou outras IAs funcionam, pode acabar aceitando respostas que não refletem o pensamento crítico dos alunos. A educação deve ser um espaço para discutir o uso ético e consciente dessas tecnologias.

Qual o papel da escola nesse contexto?

A escola é a agência de letramento mais importante da sociedade. É onde o conhecimento é sistematizado. Portanto, deve ser um espaço para discutir o uso de IA, tanto por alunos quanto por professores. Não podemos criminalizar a produção dos alunos se nem mesmo compreendemos as ferramentas que eles estão usando. Precisamos orientar os estudantes sobre como utilizar a IA de maneira ética e eficaz.

E quanto à produção de textos e habilidades de escrita?

É crucial que os alunos aprendam a escrever bons prompts e desenvolvam suas habilidades de escrita, edição e revisão. A IA pode auxiliar, mas não pode substituir o aprendizado crítico. Se os alunos dependerem exclusivamente da IA para respostas, poderão se deparar com dificuldades na vida real, como em entrevistas de emprego, onde precisam escrever textos ou se comunicar de forma clara.

Como a IA pode ser utilizada na prática pedagógica?

Podemos usar a IA para personalizar a aprendizagem, como no caso de alunos com necessidades especiais. Eu utilizei o chat GPT para criar atividades adaptadas com base em Planos de Desenvolvimento Individual (PDI). A IA fez perguntas específicas que ajudaram a personalizar o conteúdo, mas sempre revisamos o material gerado para garantir sua adequação e qualidade.

Que cuidados devemos ter ao usar IA na produção de materiais educativos?

Todo material gerado pela IA deve ser revisado. A inteligência artificial pode apresentar erros, como a geração de imagens com características incorretas. É nossa responsabilidade como educadores garantir que o conteúdo esteja correto e adequado ao contexto pedagógico.

Essa conversa destaca a importância de uma abordagem crítica e informada em relação ao uso da inteligência artificial na educação. Enquanto as ferramentas de IA oferecem oportunidades significativas para personalização e inovação, é vital que educadores estejam preparados para enfrentar os desafios éticos e práticos que surgem com essa nova realidade.

 

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